01 dezembro, 2010

o avesso

Quando parimos um ser o nosso corpo vira do avesso, não só se abre mas se contorce e se dobra, mostramos nossas "feiuras", nosso sexo, nosso odor, gritamos muito, mas não de dor, e sim de paixão, porque algo lá embaixo, queima, arde, pulsa, e algo na boca do estômago congela. A barriga se aperta, e seu filho, esse ser que se formou e se fez ser humano dentro de você, te ajuda.Quando sai é um alívio, mas não porque sofria logo antes, mas sim porque algo se concretiza, uma missão se completa. É como passar sim por um portal, chegar à ponta do arco-íris, e lá estava aquele famoso pote de ouro. Esse pote de ouro tem olhos, olhos singulares, e olha tudo ao redor, é escorregadio, é pequeno mas tão humano que sua intensidade pulsa, vibra e enche o espaço, é único.
Minha Manuela olhou tudo ao redor em silêncio e seu olhar...seu olhar era ela. E ela é única. Ali, naquele instante que gritamos e nos apertamos juntas deixamos para sempre de sermos duas em um corpo e nos realizamos dois seres. E ela nasceu aquilo que será até seu último suspiro. O último... O primeiro suspiro, a primeira tragada de ar e o primeiro olhar foram ainda junto ao meu peito, deitada na minha barriga, agora vazia, o avesso novamente escondido, nunca mais esquecido. Ela era única e eu nunca mais a mesma.
O vazio não me torturou, não tive melancolia e confesso uma saudade deliciosa de quando a barriga era pesada, mas senti cada segundo de seu esvaziamento, senti cada pedrinha do caminho rumo ao outro lado do arco íris, fui mulher inteira, em dobro, dobrada, rasgada e aberta mas pura e simplesmente pela força natural do meu corpo.
Hoje a única Manuela se mostra, se revela, tem olhos dourados e abertos, ontem se virou pela primeira vez, não do avesso, ainda não, mas rolou na minha perna e eu aprecio cada momento. Agora que vi meu avesso e me multipliquei digo que posso voar, porque sou feia, inteira e bela. E, não posso deixar de dizer, eterna.

Um comentário:

Atêlie "Bem Me Quer" disse...

Olha tenho 21 anos, não sou mãe, e ainda não tenho namorado, mas sempre fiquei pensando como será que é ter um bebê? e por meio do seu texto me senti tendo um bebê...
Parabéns pelas postagens, você escreve e descreve muito bem!!!