27 março, 2010

Tita.

O vento. Minha tia. A morte.

A fragilidade da vida é algo espantoso. Somos seres leves fingindo certo peso, leves pesos a serem carregados pelo vento. Há quem chame Deus, há quem chame destino, eu chamaria vida. Vida que só é vida pela morte, vida que só é vida porque é um instante, um instante que insistimos em fingir ser eterno. Mas a vida é frágil e é instante e é sim, como uma leve pena a ser carregada pelo vento. Presos na nossa impotência de controlar o rumo desse vento deveríamos apenas então abrir os braços e nos jogarmos. Mas inventamos pensar, e inventamos não aceitar que é um instante e muito menos que temos apenas o peso de uma pena frente à potência do universo. Por isso dói tanto a morte. E dói também a morte porque ela vem trazer a tona a idéia de fragilidade da vida, e quando a morte de alguém querido acontece, subitamente um pavor nos toma conta. Pavor de começar a perder todos.
Minha tia morreu hoje. Minha tia Tita, irmã do meu pai. Mãe dos meu primos amados, e como meu avô me disse ao telefone: sua filhinha amada. Medo de perder meu avô na sua dor. Medo de quais rumos o vento vai tomar a carregar nossos leves corpos para esse lugar estranho que é o amanhã. Medo de perder tudo. Consciência da brevidade.

Da minha tia guardo a alegria de viver, sua força, sua luta, seus palavrões, seu amor enorme, por seus filhos, seu pai, seu irmão, seu futuro neto já a caminho, o meu filho dentro da minha barriga, os programas de férias que sempre tinham algo que dava errado, seus comentários deliciosos, seu senso de humor frente às situações mais difíceis e a certeza de que ela sabia desse nosso peso leve. Lembrarei me dela com os braços esticados e o corpo solto à esse vento que nos leva ao desconhecido.
Te amo Tita. E morrerei de saudade.

21 março, 2010

Circunferência

Um lugar no espaço. Um espaço todo meu. Sem precisão de largas extensões. Um lugar sem cor, que nem branco seja. Para que possa pintar de azul bem claro e do vermelho mais intenso. Colorindo com cores contraditórias, fervurantes, vibrantes e mortas. Silencioso. Profundamente silencioso. O silêncio que vem depois da cacofonia. Um eco eterno de pausa silenciosa. Um espaço fechado na circunferência mas com dimensão infinita para o céu. Meu espaço.Ai preciso dessa circunferência. Preciso da nulidade da cor para derramar tanta tinta que ferve no meu sangue pra que evapore por cima do não teto e alcance o infinito. Meu espaço eterno. Quero meu espaço. E quero também o eco do som que me traz o silêncio.