15 maio, 2014

Nascimento de Henrique.

Falar do nascimento do Henrique é falar sobre a fé nos mistérios da vida. Em sua magia, no poder que as coisas tem quando tem que ser, no poder que nossos desejos e pensamentos tem quando jogados ao universo.

Falar do nascimento do Henrique é falar sobre assumir coisas. Tomar decisões, nadar contra a maré, tomar para si o que é seu e levar até o fim a ideia de que nem sempre o que a maioria das pessoas faz é a melhor opção para você e nem sempre o caminho trilhado pela maioria é o caminho revelador, poderoso e transformador da vida.

Henrique nasceu em casa, no seu quarto, no dia 18 de Abril de 2014, às 23h15. Um parto domiciliar planejado, respaldado por uma excelente enfermeira obstetra e apoiado por um renomado médico obstetra que conduziu meu pré-natal.

Parir em casa é assumir para si todos os riscos da vida, é agarrar com punho e alma a verdade de que o parto é um evento fisiológico e não patológico, é descobrir que, em uma gravidez de baixo risco como era a minha, ir para o hospital implica infinitamente mais riscos para mim e para o meu filho a tê-lo no aconchego do meu lar.É entender que a vida é feita de assumir que ela é frágil e intensa e que sempre haverá algo maior que nós a determinar sua fragilidade..

Henrique é meu segundo filho, a primeira, Manuela, nasceu em um parto natural hospitalar, sem analgesia, episiotomia, sem muita intervenção. Manuela saiu de mim e veio direto para o meu seio, onde ficou por duas horas, tendo o cordão cortado após parar de pulsar e não teve seus olhos violentados pelo colírio de nitrato de prata. Manuela foi meu primeiro parto de mim mesma e contra o sistema. Foi o primeiro sintoma da mulher que eu era e gostaria de ser. Manuela me revelou o quão poderosa eu era e o quanto todo o sistema do parto no meu país estava errado, como era apenas mais uma faceta de uma sociedade machista que subjuga as mulheres. Parir Manuela me revelou como fêmea, poderosa, leoa.

Então veio meu doce Henrique. Uma gravidez tumultuada, dois empregos, uma filha pequena amedrontada sobre o que seria ter um irmão, uma gripe violenta, um tombo, um carro descendo a ladeira e eu literalmente segurando com as mãos, um strepto positivo no final. Muita leitura, conversa, muita reação espantada de pessoas que diziam: vai parir seu filho em casa??? Coloca uma ambulância na porta.
Não as julgo, quando não temos informação o medo é nosso guia, vivemos em uma sociedade alarmista, que trabalha a partir da doença ao invés da saúde, temos um cenário onde o parto se tornou um evento do médico, cirúrgico, quase uma enfermidade, um perigo. Mas não é. E quando descobrimos que tudo isso é uma grande mentira nos deparamos com nós mesmas. Mulheres gigantes e poderosas.

No parto de Manuela me entreguei em um barco a deriva, não sabia onde ia chegar, mas me entreguei. As ondas me levaram e eu simplesmente me deixei levar confiante. Quando foi a vez de Henrique eu tomei o remo, as rédeas e trabalhei junto com meu corpo. Às 18h30 do dia 18 foi quando as contrações ficaram regulares, Manuela foi para cama com o pai. A essa hora, se anjos existem estavam todos aqui em casa. Neste dia minha filha não me pediu para dormir com ela, foi só com o pai e eu fiquei só. As contrações eram muito fortes, o que me fizeram crer que seria muito rápido. A cada contração eu focava minha mente para dentro de mim e impulsionava com meu pensamento e respiração meu útero para que se abrisse. Às 21h minha doula chegou. Às 21h50 as enfermeiras. Fiquei a maior parte do tempo em meu quarto. Eu, Henrique e meu corpo trabalhando juntos. Eu sabia exatamente em que estágio do trabalho de parto estava. Disse ao meu marido, "ele vai nascer daqui a pouco", para espanto do Leo que estava esperando as 12 horas do trabalho de parto da Manu. Mas eu sabia, sabia de tudo, e trabalhava com tranquilidade para que acontecesse.
A banheira foi cheia no quarto de Henrique e eu fui para lá. Surpreendida por uma luz azul, que minha doula colocou no quarto, fui arrebata pela água morna. À minha frente, sentada e sorrindo a enfermeira Odete. No teto as fadas do quarto do meu filho, nas paredes as nuvens que fiz. Então eu disse: Filho seu quarto está lindo! Disse isso com toda minha alma. Então veio a contração final. Me virei de quatro e Henrique nasceu. Sem que ninguém o tirasse de mim. Ao som da minha respiração e sob a força do meu corpo ele lentamente saiu de dentro de mim e foi amparado, na água, por Odete, que me entregou imediatamente meu lindo filho. Duas circulares de cordão, 3k765, 53 cm. Olhos puxados, amendoados. Eu o pari. E na mesma hora, em outra cidade, onde estava sua bisavó uma linda borboleta invadiu a sala.
Nasceu Henrique.
Manuela dormia, assim como eu e ela desejávamos. E ao acordar pela manhã encontrou seu irmão na cama, trazido pelos anjos. Para ela ele atravessou sim um portal dourado e desceu pelo arco-íris.
Pouco depois de parir Henrique eu pari a placenta, a toquei, agradeci, tomei um ponto em uma laceração que não senti, tomei sopa trazida por minha mãe e dormimos todos aqui. Eu, Leo, Manuela e Henrique, família e parte um dos outros que somos.
Não acredite que você não é capaz. Sempre somos. Nossa vida está em nossas mãos. E aí então os anjos sempre dizem: amém.