02 outubro, 2012

Que sei eu


Nomes. Um dia recortamos tudo. Demos nomes. Inventamos palavras. Reduzimos o sentido ao som da junção de letras. E então fazemos assim com tudo na vida. Profissão. Paixão. Realização. Nome. Nome. Nome. Damos tanto nomes para o que há fora de nós que o que não se chama também não se ouve.
Hoje quando me perguntam minha profissão tenho que pensar muito. Sou professora de teatro. Me formei em jornalismo. Escrevo sempre que dá, um coisa aqui e outra acolá, pouca ficção, muita reflexão, desabafo, as vezes poesia. Arranco algumas lágrimas dos leitores com palavras doces e sentidas, sei colocar no papel um bucado de coisa e sou uma contradição porque as vezes não acredito nas palavras mas me delicio com elas. Como não acreditar? Manoel de Barros é meu santo salvador e me salva por palavras. Deve ser porque ele não reduz sentimentos pelo som de letras. Ele os amplia, os mastiga, os colore. Então a palavra deixa de ser um recorte e vira arte. E se vira arte é extensão da vida, é transfiguração; mas me falta ousadia de me dar o nome de escritora. Sou mãe. Muito mãe. De amamentar até os dois anos, de mudar de cidade para dar uma casa mais confortável. De não cogitar, e preste bem atenção ao som dessa palavra COGITAR sacrificar nossa relação por coisas que, para mim, são menores. E olha que para ser menor que meu amor por ela não precisa lá ser algo tão pequeno. Sou dona de casa. Decoradora. Ultimamente me descobri habilidosa com as mãos. Faço borboletas de papel para varanda, prego com cola flores secas na parede e perco o sono elaborando presentes doces criativos para pessoas que amo. Sou cozinheira. Pesquiso sabores diferentes, compro orgânicos, integrais, não industrializados, não como carne, faço eu mesma o leite de coco. Que nome seria isso? Seria isso também uma profissão? Fiz 5 anos de escola de teatro, três no Brasil, dois em Londres. Me transformei. Saí da Inglaterra ouvindo: você precisa ser vista. Dei com a testa na porta, chorei. Só.Falei uma frase em um longa, uma peça pequena em Londres. Muito treino. Muito ensaio. Só. Seria atriz?
Que nome que a gente tem? E só de escrever quantos nomes carrego tirei o peso de me definir. Não tenho nome. Manuela me chama de mamãe juju, meu marido de amor, minha mãe de Julieta. Eu me chamo de não sei.  

2 comentários:

Leonardo OCunha disse...

Já dizia Saramago: "Conheces o nome que te deram, não conheces o nome que tens."

Natymeireles disse...

Quem te conhece sabe e admira e ama! A atriz, a jornalista, a mãe, a prima, a amiga!